Para que serve viver nos Açores?
“Quem está mal que se mude”. Esta máxima, que ilustra bem o carácter pessimista e resignado dos portugueses, podia servir de resposta ao título provocatório desta crónica. Resposta essa simplória, típica de quem foge ao problema que a pergunta levanta. Se os Açores progrediram nestas últimas décadas, as outras regiões do país e do mundo não ficaram em nada atrás; antes pelo contrário. Graças às novas tecnologias e aos meios de comunicação é fácil saber o que se passa lá fora e comparar com o que se passa cá dentro. Na verdade, ao fazer este exercício comparativo, torna-se cada vez mais consternante o quanto os Açores vão ficando para trás em aspectos essenciais da vida, acabando por pôr em causa a própria razão de existir do arquipélago com nove ilhas todas elas habitadas.
As ilhas mais pequenas têm sofrido com o esvaziamento da sua população que a todos preocupa e obriga o governo a tomar precauções. Contudo, por mais medidas que se tomem, o problema não se resolve e parece acentuar-se. A migração das pessoas para as grandes cidades é um fenómeno global e não exclusivamente açoriano. Nos Açores, o efeito dessas deslocações é mais dramático porque se tratam de ilhas. O cerne da questão reside na qualidade de vida que as pessoas pretendem alcançar. O emprego bem remunerado não é a única resposta a dar para incentivar as pessoas a não partir. Dar prémios por cada criança que nasça também não é uma solução. Este problema, é preciso reconhecê-lo, não tem solução. Qualidade de vida implica um bom sistema de saúde implementado em cada ilha, uma boa distribuição de bens alimentícios, de primeira necessidade e de luxo variados mas baratos; um sistema educativo e formativo apelativo, bem equipado e adequado não só às necessidades da terra, mas sobretudo às ambições da juventude; uma oferta cultural, desportiva e recreativa diversificada e dinâmica; oportunidades de emprego imediato; enfim tudo o que uma Lisboa pode oferecer. Escrevi Lisboa, mas se escrever Ponta Delgada é a mesma coisa. Sim, a migração já não é tanto para fora da região, mas de todas as ilhas para São Miguel. A premissa deveria ser: Viver isolado não tem custos, mas só traz benefícios. Utopia? Obviamente.
O ser humano não anseia ser igual aos outros; anseia ser melhor do que os outros, ter mais do que os outros, em todos os sentidos. E, para isso, enceta todos os esforços, fazendo todos os sacrifícios possíveis. Por isso, o progresso é inerente ao Homem, daí este primeiro problema não ter solução. Como o Urso Polar faz parte das espécies em vias de extinção, talvez os corvinos serão os próximos a integrar essa lista, com todo o devido respeito pelas duas espécies mas consciente da realidade que as espera, a ambas.
Quando se é socialista de gema, de coração e de cartão de militante o mais certo é cair-se em incongruências. Esta semana, o CDS/PP Açores lá deu, com esperteza, uma demonstração do facto. A questão das passagens aéreas, vitais para quem é ilhéu, continua a ser um grave problema. Enquanto que nos continentes as low cost vão conquistando mais mercado e alargando o seu ramo de negócio, os cabecilhas da SATA e da TAP, em conluio com o Governo, explicam com fórmulas incompreensíveis por que os açorianos pagam tanto para viajar de avião. Se a SATA se vangloria tanto por ser a auto-estrada dos Açores, então que se lhe aplique o estatuto de SCUT nas suas tarifas. Pelos vistos, o socialismo é só para alguns. Nesta semana, ficou também demonstrado que os combustíveis conseguem ser mais baratos no continente do que cá. Sinceramente, não se entende.
Num terceiro exemplo, a ilha Terceira tem convivido ao longo de décadas com uma amostra do que é a nação mais rica e próspera do mundo. Em quê que a Terceira ganhou com a presença americana na Base das Lajes? Pouco. E se olhar para a magnanimidade dos Estados Unidos nada. Alguns passes para ir às suas lojas francas, alguns empregos para privilegiados e dependentes do factor cunha, algumas viagens e passeios até Washington para os representantes da região que se pavoneiam nas margens do rio Potomac. Cultural e cientificamente nada se ganhou. Em termos de enriquecimento económico ainda menos. Nem o Estado português sabe exactamente o quanto ganha com esse arrendamento. A única coisa que se conseguiu nos últimos tempos foi com Câmara de Comércio de Angra que, de tanto reclamar por causa dos seus comerciantes, fez com que brevemente nenhum terceirense porá os pés na “América”, eliminando por completo o pouco que os americanos proporcionavam à população. A raiz do problema não está na “invasão” dos produtos americanos em solo terceirense. O problema reside na falta de dinamismo e criatividade do tecido empresarial terceirense ligado à comercialização de bens e produtos. Oferecer descontos e brindes de Natal atrairá as pessoas para fazer compras no centro de Angra? É essa a estratégia? Para o ano, já que a Base deixará de incomodar, será a vez das lojas chinesas serem o próximo bode expiatório para problema da crise do comércio dito tradicional.
Entretanto, em Ponta Delgada, abrirá o terceiro centro comercial. Todos os caminhos vão dar PDL. Pois é, quando uma cidade se torna cosmopolita, até o seu nome muda.
1 Comentários:
Caro Paulo,
discordo quanto ao impacto da Base, se comparar os diferentes locais onde os EUA instalaram bases na década de 40 verá que as Lajes foi a que teve maior crescimento.
Todos sabemos que a base não tem sido potencializada em termos económicos, fruto de más negociações, no entanto há ganhos evidentes.
Fala na cultura, mas esquece-se da implementação do jazz na Terceira pelos norte-americanos ou dos instrumentos que permitiram a criação e desenvolvimento das filarmónicas. Ainda na cultura o ensino de música durante largos anos deveu-se aos norte-americanos - em especial no concelho da Praia da Vitória.
Em termos cientificos, o estudo e os melhores livros durante décadas foram por livros norte-americanos. A laboração na base permitiu a introdução de novas técnicas de construção na ilha, as faltagem por exemplo. Os primeiros sulfatos e produtos para a agricultura vieram da base. A percepção geral do mundo e cultura-geral também elevou-se com a convivência com os americanos
Em todas as áreas há ganhos evidentes e a base continua a ser motor essencial no tecido económico da ilha, o problema é que não está a ser bem aproveitada, dai dizer-se que ganhou pouco e em termos culturais e cientificos nada, vai um longo passo.
Haja Saúde
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