Complot

Este blogue nada tem de original. Fala de assuntos diversos como a política nacional ou internacional. Levanta questões sobre a sociedade moderna. No entanto, pelo seu título - Complot -, algo está submerso, mensagens codificadas que se encontram no meio de inocentes textos. Eis o desafio do século: descobri-las...

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domingo, agosto 29, 2010

O que resta da BA4



O mundo mudou muito desde que os americanos se instalaram na Terceira. A Europa pacificou-se e os conflitos divergiram para outras partes do globo. Em consequência, a Base das Lajes perde de relevância para o governo americano. Olhando para o passado, é fácil perceber que o actual debate em torno do futuro da BA4 é triste e redutor: a discussão resume-se a questões laborais e a especulações quanto a hipotéticas novas valências de uma base militar que se tornou praticamente obsoleta.

Nos últimos anos, criaram-se expectativas quanto à possibilidade de a Base das Lajes servir de “campo” de treino para novos aviões e a de poder receber o comando AFRICOM. Foram ilusões que preencheram editoriais e permitiram que especialistas pudessem prognosticar sobre o assunto, mas de facto nenhum de nós viu a verdade com olhos de quem quer realmente ver.


Os conflitos geopolíticos situam-se a Oriente; os países emergentes encontram-se noutros continentes, deixando a Europa numa crise existencial sem precedentes; os Açores ficam muito longe de África, por isso os americanos não ganham nada em deslocar o comando da base alemã para cá. A crise impera e serve de desculpas para tudo. Na verdade, o que não mudou nestas décadas é a especial localização dos Açores no Atlântico. O que simplesmente aconteceu foi que de uma vantagem estratégica primordial e decisiva, o arquipélago passou a ter uma vantagem estratégica residual e simbólica.


As décadas de 50 e 60 foram de ouro para a ilha Terceira. Como Região pobre, a ajuda americana fazia todo o sentido e toda a diferença. Muita da alta tecnologia da altura chegou aos açorianos graças aos Estados Unidos; a presença americana foi determinante para a abertura de espírito e cultural dos terceirenses; a cruz vermelha americana foi decisiva para atenuar a pobreza que se sentia na ilha. Muitos terceirenses enriqueceram, deixando uma pobreza medonha para ter uma vida faustosa e cómoda. A economia paralela ajudou aqueles que não trabalhavam para os americanos. A Vila das Lajes e a freguesia de Porto Martins são prova desta pujança económica que a Base proporcionou e ainda proporciona a muitos terceirenses. No entanto, com os anos, perderam-se milhares de empregos, mas os que restam são cobiçados por muitos. Sim, os salários continuam a ser altamente atractivos. Sim, quem trabalha na Base tem a vida facilitada em muitos aspectos. Sim, continua a valer a pena trabalhar para os americanos da Base.


Por isso, de cada vez que algum sindicato se insurge contra as condições de trabalho dos portugueses na Base, de cada vez que um dirigente sindicalista vocifera contra o inquérito salarial, de cada vez que um partido da oposição grita por aquilo que considera ser uma “traição” do Governo Regional ou da República nas negociações bilaterais, eu pergunto-me: mas será que estamos a falar dos mesmos trabalhadores? Daqueles que trabalham para os americanos da Base das Lajes?


O problema dos sindicatos envolvidos nas questões da base não é laboral, é ideológico. O comunismo e antiamericanismo – o pleonasmo é propositado - grassam e muito, obnubilando os sindicalistas da realidade que circunda a BA4. O Governo Regional pouco pode fazer e o facto de o assunto não ser conduzido directamente pelo Presidente do Governo Regional mostra que, para os governantes, as coisas estão bem como estão. O dinheiro da “renda” da base sustenta a lisboeta FLAD e alguns projectos estão em curso dos quais o benefício é insignificante para os açorianos. Algumas conferências para fazer de conta, onde se ouve estudiosos da política internacional defenderem que se a Europa entrar em guerra contra Estados Unidos, os Açores voltarão a ser cruciais. Nem Hollywood conseguia fazer um enredo mais patético. Mas quase que passa despercebido que, em 2007, os americanos deram a ganhar mais de 77 milhões de euros à Região.


Em Novembro, aquando da Cimeira da NATO em Lisboa, o Primeiro-ministro português terá uma boa oportunidade para fazer valer os interesses portugueses nas Lajes. Mas haverá mesmo vontade política e diplomática? Como se adivinha, por cá, haverá novamente especulações sobre o futuro da Base e aparecerá alguém com uma nova proposta, história de acalmar os ânimos. Mas o declínio parece o substantivo mais correcto para caracterizar o estado em que esta se encontra.


Podemos gastar tinta e mais tinta, debatendo sobre as possíveis novas valências da Base mas isto serve de pouco. Afinal, estamos a falar de uma base militar e não de um hotel em ruínas. Sempre defendi que perante estas circunstâncias a diplomacia devia começar de baixo para cima, o que significa que os autarcas da Terceira e a Câmara de Comércio é que deveriam tomar a iniciativa de fortalecer contactos com o comando americano com vista a uma interacção económica, cultural e social mais intensa.


Mas como temos visto, numa terra onde a inveja alastra como as vacas proliferam, mais vale estar calado.

1 Comentários:

Blogger Manuel Martins disse...

Caro Paulo
Disseste, ou seja escreveste, no DI precisamente o que eu gostaria de ter feito,mas faltou-me o talento e os conhecimentos.
Do meu ponto de vista como trabalhador na Base das Lajes para os americanos e filho de outro trabalhou que por lá andou 46 anos, falaste directo e bem e na verdade,sem sofismas nem "redondilhas".
Que não tenhas dores nas mãos para continuares com essa frontalidade de bom articulista.
Abraço
Manuel de Meneses Martins

10:17 da manhã  

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