Paraíso Perdido XXIII
A possibilidade de uma ilha
Nos primeiros mandatos de Mota Amaral enquanto presidente do Governo Regional dos Açores, um dos primeiros objectivos para moralizar a autonomia foi o de descentralizar o poder político. Desde as Secretarias Regionais à Assembleia Regional, os dois grandes partidos de poder – PS e PSD – acreditavam que a democracia açoriana funcionaria melhor atendendo a uma distribuição de poderes por diversas ilhas. Acreditava-se também na possibilidade de um desenvolvimento harmonioso do arquipélago, em que nenhuma ilha ficaria para trás. Presentemente, o receio da centralização de poderes e instituições na ilha de São Miguel, e a necessidade de aumentar os apoios para as ilhas da coesão provam que a região encontra-se numa crise existencial profunda.
Não vejo nenhum mal que o actual governo defenda certas medidas centralistas em nome da poupança e de uma boa gestão dos recursos económicos e humanos. O que falta é discutir o que mais se pode fazer para gerir melhor os dinheiros públicos da região. Não será melhor equacionar as vantagens de recolocar todas as secretarias e direcções regionais numa só ilha? O que é mais dispendioso: a Assembleia Regional situada no Faial ou em São Miguel? Não convém esquecer o lamentável incidente com o deputado do PPM eleito pelo Corvo que exigia um local próprio para exercer as suas funções e não a sua casa como os seus antecessores faziam anteriormente.
À parte as questões políticas, existe o mesmo problema em termos de estratégia económica. Por que razão uma ilha há de ter vários centros de saúde, em vez de concentrar os recursos numa só unidade de saúde, melhorando assim o serviço? Por que razão uma mesma ilha há de ter marinas em tudo quanto é vila quando o proveito dessas é insignificante?
Os exemplos de mau gestão governamental pululam pelas ilhas, por isso torna-se complicado perceber o governo regional cada vez que usa o argumento da poupança. Mas os políticos preferem os faits-divers do que certas verdades incómodas. Em vez de se discutir a essência política da região, prefere-se perder tempo debatendo se o hastear da bandeira açoriana em quartéis militares deve ser obrigatório ou não à luz do tão querido novo Estatuto.
Brincar ao Código da Vinci
No discurso político, pede-se clareza e objectividade. Ultimamente, a moda é a de falar verdade, o que indirectamente acaba por sugerir que tudo o que foi dito até agora era mentira. Mas se há uma coisa em que os políticos são exímios é a de falar por códigos, desafiando os mais astutos na arte da criptografia.
Durante a visita do Governo Regional à Graciosa, numa espécie de acto de humildade ensaiado, Carlos César falou sobre os malefícios que acarreta a permanência prolongada no poder. Afirmando a necessidade de renovar os agentes políticos, o discurso acabou por criar alguma perplexidade junto dos mais atentos à coisa política. Para quem era direccionado?
Bem podia ser uma resposta à entrevista de José Contente na qual defende a legalidade jurídica de um novo mandato de César à presidência. A crise no PS Açores por causa da sua futura liderança está lançada. Apesar da tentativa do Secretário Regional em apaziguar algum entusiasmo interno, a questão não se resume ao aspecto legal; a questão é simplesmente política. E Carlos César entendeu isso. Por isso, por uma questão de coerência e sobretudo de moralidade política sabe que não pode falar em renovação e ao mesmo tempo colocar-se a hipótese de uma recandidatura ao cargo.
Sem receios e de forma democrática, o PS Açores tem de criar todas as condições para que apareça um sucessor que se baseie nos princípios ideológicos do partido. É demasiado presunçoso achar que os outros não têm preparação ou estofo para o cargo. É preciso dar oportunidade ao pior e ao melhor que a democracia propicia. Se já não há empregos para a vida, por que razão haveria de existir cargos políticos vitalícios?
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