A greve ainda é uma arma poderosa
Temos ouvido um pouco por
toda a comunicação social que as manifestações e as greves são infrutíferas ou
inconsequentes por causa dos compromissos acordados entre Portugal e as
instâncias internacionais envolvidas no processo de resgate. Por isso, não
surpreende que, de cada vez que os sindicatos anunciam greves para dias cujo
impacto afeta a vida dos cidadãos, os responsáveis políticos acusem-nos de
fazerem chantagem usando as pessoas.
Nunca esteve em causa a necessidade
de o país reformar os seus serviços públicos com o intuito patriótico de se tornar
mais competitivo, mas sobretudo mais justo e próspero. Contudo, não está
provado cientificamente que basta seguir à risca as sugestões de um estudo
académico ou de um programa político para ter sucesso. Portugal deixou de ter
soberania financeira, mas, que se saiba, nunca deixou de ser um Estado de
Direito. Um Estado de Direito estabelece uma relação de força entre o poder -
detido pelo Governo ou pelo Parlamento - e o contrapoder - que abrange os
tribunais, sindicatos até a sociedade civil.
Num momento historicamente dramático
para Portugal, seria absolutamente insólito que o contrapoder fosse um elemento
passivo face às medidas apresentadas. É óbvio que os sindicatos têm os seus
defeitos, nomeadamente quando desprezam a viabilidade da instituição ou empresa
em causa. Mas seria injusto e cínico achar que todas as medidas de reforma
apresentadas por este ou qualquer outro governo são sempre certeiras, justas e
positivas quer para os patrões quer para os empregados. Aliás, isso acontece,
mas é nos filmes.
A
crise tem posto à prova o modelo social que foi sendo criado e nunca como agora
quem representa os trabalhadores assiste com preocupação a um retrocesso nas
relações entre trabalhador e empregador. Há inúmeros casos de pequenas e médias
empresas que oprimem os seus funcionários, obrigando-os a exercer tarefas que
extrapolem as suas funções, reduzindo os seus salários ou até atrasando os ordenados,
sempre com o argumento de que se não fizerem o que o patrão manda, vão para a
rua.
Por tudo isto, não se pode estar com
o discurso dúbio que consiste em defender o direito à greve, mas somente quando
não perturba a vida das pessoas. É um contrassenso. Não se pode dizer “concordo
com o direito à greve, mas…”. Já vimos isto com a TAP, com a SATA, com os
transportes públicos terrestres e agora com os professores.
A
tendência é para certos jornais, ou em causa própria ou então a pedido, iniciarem
uma espécie de linchamento público dos trabalhadores, evocando os salários
“chorudos”, as regalias e outros detalhes com o único propósito de pôr uns
contra os outros.
Um
governo não pode apresentar medidas, dizer que não mudará de rumo e, a seguir,
sentar-se à mesa das negociações com os parceiros sociais. É o cúmulo do
cinismo, o convite à tirania. Uma democracia madura funciona com uma constante
tensão na procura de consensos entre poder e contrapoder. Negociar implica
perdas e ganhos. Para ambos os lados.
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial