O perigo do partido único
No continente, a política tem a
seguinte equação: no litoral, adere-se a um partido para arranjar emprego; no
interior, adere-se a um partido para não perder o emprego. Os Açores têm o
“mérito” de juntar as duas opções. Nos Açores, partido há só um: o PS e mais
nenhum.
Os
Açores deixaram de estar imunes à crise. Mesmo com atraso, ela entrou em força
e paralisou praticamente toda a economia da Região. O que vale é o número
substancial de funcionários públicos que ainda seguram a já tão débil economia Os
números do desemprego, encapotados pelo fator emigração e pela falácia dos
estágios para jovens, são assustadores; o número de famílias dependentes dos
apoios sociais é preocupante; a quantidade de pedidos de alimentos ao Banco
Alimentar ou à Cáritas aumenta de dia para dia; o número de empresas ou hotéis
a fechar é galopante. Todos nós andamos preocupados, a dormir mal, por causa
deste flagelo social.
Acredito
piamente que qualquer político açoriano, seja de que partido for, não anda bem
com o que se passa. Por questões de apego ao poder, ninguém quis reformar a
sério a Região em tempos de vacas gordas. Agora que tudo escasseia, qualquer proposta
de reforma para o que quer que seja é recebida com desconfiança e até revolta.
Reestruturar
o sistema regional de saúde, por exemplo, comporta muitos riscos porque a
tendência é sempre de centralizar serviços e recursos humanos numa única ilha
ou unidade. Chama-se a isso economia (estranho é não constar do documento
números concretos sobre as poupanças que tal reforma origina). Mas as teorias
de economia não funcionam para um arquipélago. As reações não se fizeram
esperar, e ao contrário do que alega o PS, existe um consenso em relação à
proposta: ninguém a quer como está presentemente desenhada. Não são só os
partidos da oposição; há médicos, empresários, sindicatos, Conselhos de Ilha e
personalidades de relevo regional que manifestam a sua preocupação, quando não
rejeição, relativamente à proposta. Mas não seria sério da minha parte não
referir que o documento também tem propostas interessantes.
Há
tempos, falava nas forças vivas da Terceira, mas pequei por defeito. As forças
vivas estão em todas as ilhas, como provam a criação de um movimento cívico no
Faial ou a candidatura de um independente em Vila Franca do Campo. Em ambos os
casos, há uma clara insatisfação para com os governantes. Os açorianos deixaram
de estar passivos perante o que lhes pode acontecer. Ainda bem porque as coisas
ainda vão piorar.
O
PS tem uma presença esmagadora e sufocante na vida dos açorianos. Nem se pode
culpá-lo pelo sucedido, pois o próprio povo assim o quis. No Governo Regional,
na Assembleia Regional, nas autarquias, nas juntas de freguesia, nas empresas
públicas e municipais o domínio é perigosamente elevado.
No
atual contexto, com o desespero das pessoas, a pressão aumenta
consideravelmente e o cartão partidário poderá parecer um mal menor quando, em
troca, se coloca a questão do emprego. Ao longo dos anos, o PS foi ganhando
soberba. O PS foi alimentando um autoconvencimento de que acerta em tudo no que
faz e que a oposição é demagógica ou incompetente. O PS cimentou a ideia nos
açorianos de que quando algo vai mal é por culpa dos outros, nunca por
responsabilidade própria. E o povo aceita, não por cegueira ou estupidez, mas
por medo do futuro. O perigo da Madeira tornou-se uma realidade.
Com
o empobrecimento geral da população, a liberdade definha. Mesmo a liberdade de
expressão transforma-se numa virtualidade inconsequente que se limita a um mero
efeito “psicoterapêutico”. Se há alguns anos atrás se falava em falta de
oxigénio nos Açores, presentemente, pode-se falar em respiração assistida pelo
único detentor da máquina, a saber, o PS. Nos Açores, já só há poder. O
contrapoder transformou-se numa farsa institucional.
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial