Escola nova, problemas antigos
Visitar um museu é como viajar no tempo e no espaço. Revive-se, de certa forma, tempos antigos; conhecem-se civilizações, culturas e tendências artísticas que marcaram indelevelmente a Humanidade. É imprescindível entender o passado para nos conhecermos a nós próprios e perceber quais os caminhos que os Homens traçaram até aos nossos dias com reconhecidos erros e injustiças, mas também virtudes e glórias. A perfeição não é um estado; é uma jornada.
Se os museus proporcionam aos seus visitantes um passeio pelo passado, a escola possibilita aos seus alunos uma viagem para o futuro. Em cada início de ano lectivo, há um sentimento de euforia que paira no ar. Novos professores, novos colegas de turma, futuros amigos ainda desconhecidos, primeiras paixões e tristezas amorosas. E, não esquecendo o mais importante: a aquisição de conhecimento. A escola é, na sua essência, propulsora do progresso, da emancipação e da liberdade. Por isso, Setembro é o mês mais esperançoso do ano. Se acrescentarmos a isso uma escola moderna, construída de raiz, com aquele cheiro inconfundível a novo, contemplada pelas novidades tecnológicas e pedagógicas, então, sim, a satisfação é total. Toda a comunidade devia ser convidada a partilhar este dia memorável que é o da abertura de uma nova escola. Excursões deviam ser organizadas para que os reformados, vítimas do atraso do seu tempo, pudessem ver, com alguma nostalgia à mistura, como a escola evoluiu, ficando mais bonita e acolhedora. Melhor do que inaugurar uma nova rota aérea para o turismo ou uma nova estrada, a abertura duma escola não merece um rancho folclórico na sua inauguração, mas sim uma orquestra sinfónica.
Contudo, nem tudo são rosas. A Escola Secundária Tomás de Borba, em São Carlos, era para abrir, abre, abriu, vai abrindo as suas portas. A abertura estava programada para Setembro de 2007, mas tornou-se impossível. Era para abrir em Janeiro de 2008, mas ainda não estava totalmente pronta. Entretanto, vai recebendo crianças e jovens, uma semana uns, na semana seguinte outros, misturando-os entre os trabalhadores das empresas construtoras que se apressam em cumprir um prazo do qual não se tem informação. Em Setembro deste ano, a escola não abrirá, pois já está aberta. Abriu no terceiro período. Melhor dizendo: abriu no final do segundo período. Para os alunos do terceiro ciclo e secundário, a escola abriu num sábado, dia para a entrega de notas. Não conheço pior forma de inaugurar uma nova escola. Para além dos problemas que uma nova escola pode induzir ao nível do seu funcionamento, do período de adaptação de que os seus intervenientes precisam e da respectiva necessidade em efectuar ajustamentos, os alunos e professores trazem consigo problemas que tinham na anterior escola.
Quando a Escola Tomás de Borba podia ser o símbolo de ruptura com os vícios das outras escolas, quando podia reflectir um novo espírito moderno e progressista, o momento escolhido para a sua abertura é o mais inoportuno, podendo deitar por terra toda a expectativa criada à sua volta.
Convém não esquecer os incómodos que a decisão política de a abrir ainda este ano acarretou na escola secundária de Angra. Sofrendo já problemas de lotação, o antigo liceu de Angra fez do lema “dois em um” o seu dia-a-dia. Com um número de alunos por turma superior ao recomendado, não houve espaço para pedagogias de sucesso; foi cumprir e aguentar. Com essa decisão política, quantos alunos do terceiro ciclo não foram prejudicados por estarem integrados em turmas com 30 elementos? Quantos alunos sentiram que a escola os abandonou porque a preocupação em manter a ordem superou a necessidade de os ajudar nos seus problemas? Quantos pais viram naquela escola a parte do problema e não da solução? Disso, ninguém saberá; foi cumprir e aguentar. Disso, em Setembro, ninguém se lembrará. Em pleno final de campanha eleitoral, haverá festa, pomposa inauguração e políticos sorridentes, confiantes de que o insucesso escolar só pode ser combatido com novas tecnologias e avaliação de professores.
A nova moda do “eduquês”, inventada nos gabinetes dos assessores, é a de comparar a escola a uma empresa. Mas os políticos esquecem-se – ou fazem por não se lembrar – de que, se nas empresas existe o conceito de atendimento personalizado, também na escola existe o conceito de ensino individualizado. Enquanto a escola pública não chegar a todas as camadas sociais sem perder qualidade e exigência, e não proporcionar a todos as mesmas oportunidades mas igualmente alternativas credíveis, não haverá verdadeiro sucesso nas escolas e muito menos futuro.
1 Comentários:
Bem, parece-me que concordo com tudo o que dizes neste poste. Temos que comemorar.
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