Como perdoar caloteiros
Da Câmara Municipal de Angra
nasceu uma ideia brilhante que irá revolucionar as políticas públicas de ação
social. Até os partidos de Direita apoiaram a iniciativa, não pelo valor em si,
mas pelo embaraço que significaria a sua reprovação. A isto se chama demagogia.
Lamentavelmente. Na verdade, a iniciativa de substituir o pagamento de rendas
sociais em atraso pela prestação de trabalho comunitário é incompreensível à
luz do respeito pelos princípios básicos de solidariedade social e sobretudo da
decência.
Obviamente que o que escrevo não
passa de uma opinião. No entanto, não deixo de condenar esta iniciativa e de me
distanciar dos meus companheiros de partido. Quando a Câmara estabeleceu
contratos de arrendamento social, fê-lo como se faz com qualquer contrato de arrendamento.
Em caso de incumprimento por qualquer uma das partes, haveria consequências devidamente
previstas na lei. O problema, que não só abrange Angra como grande parte das
autarquias a nível nacional, é que, pelo facto de as rendas serem tão baixas
(entre 5 e 100 euros) e pelo facto de essa franja da população ser relevante no
momento do voto, nunca houve intenção de punir quem deixasse de pagar. E é
público que alguns inquilinos não pagam há anos.
Se as câmaras tivessem sido
rigorosas desde o início no cumprimento do contrato, não teriam chegado a tal
situação - em Angra, a soma das rendas em atraso rondam os 300 mil euros. A
Câmara de Angra deveria ter procedido a um plano de pagamento de rendas em
atraso com a cooperação do Governo Regional e da Segurança Social - pois muitas
famílias beneficiam de subsídios -, mas nunca ter recorrido ao perdão (porque é
disso que se trata) em troca de trabalho comunitário. O trabalho comunitário
não substitui o dinheiro que uma autarquia deve auferir por este tipo de apoio
social. Não há moralidade nenhuma em usar o dinheiro dos contribuintes para
construir casas e, a seguir, deixar pessoas lá viver à borla em troca de uns
biscates.
Com
esta crise, quantos açorianos já tiveram de entregar as suas casas ao banco por
não aguentar com as prestações de crédito; quantos terceirenses tiveram de
mudar de casa por não suportar a renda contratualizada; quantas famílias de
Angra tiveram de emigrar para pagar as suas dívidas? Angra criou um precedente
grave: por um lado, temos alguns cujo dever é cumprir, custe o que custar; por
outro, temos outros abençoados pela legalização do calote.
O mais ridículo nisto tudo é que, se
as eleições autárquicas não estivessem à porta, esta solução nunca existiria.
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