O choque insular
Permanecer no poder durante muitos anos traz vícios e provoca alguma distorção da realidade. O governo de Carlos César demonstra algum cansaço (palavra na moda) no exercício da sua função. A atribuição de novas competências aos seus delfins – Vasco Cordeiro e Sérgio Ávila – mostra que o presidente do governo sente alguma dificuldade em coordenar os desafios que os Açores exigem cada vez mais num mundo globalizado e em que os subsídios comunitários parecem escassear. O desequilíbrio dos investimentos nas ilhas tende a ser o reflexo de políticas desajustadas mas, sobretudo, da falta de sentido de empreendimento dos próprios ilhéus.
Carlos César encontrou-se com o Presidente da República para o alertar da “dupla insularidade” dos Açores, comparativamente com a Madeira, e, consequentemente, para que a atribuição das ajudas do Estado tivesse este factor em conta. A dispersão das ilhas do arquipélago açoriano, bem como a distância entre as ilhas fundamentam este tratamento diferenciado relativamente à Madeira. No entanto, se compararmos o investimento público e privado que é efectuado em São Miguel, nomeadamente Ponta Delgada, com as outras ilhas, tais argumentos utilizados por Carlos César caem por terra. A ilha de São Miguel possui mais de metade da população açoriana; é um facto. Mas ilhas como a Terceira ou o Faial têm as mesmas condições para atrair investimento. Uma pergunta surge: porque é que estas ilhas estão tão apagadas? A culpa não pode ser toda atribuída ao executivo. A população caiu num marasmo e num conformismo decepcionantes. Os autarcas, pessoas de real poder, ou estão demasiados confinados aos seus partidos (vejam que, nestas duas ilhas, o PS domina em todo o seu esplendor), ou não são competentes o suficiente. Esta frustração resulta numa migração dos cidadãos para São Miguel ou então para o continente. Entretanto, as restantes ilhas são repovoadas, não oficialmente, com imigrantes de Leste e de África – até o seu trabalho acabar. A desertificação de certas ilhas é uma consequência cada vez mais visível e preocupante. Querer resolver este problema com mais dinheiro não é uma solução, é uma forma de esconder a cabeça debaixo da areia. Se houver qualidade de vida e se cada cidadão for útil para a sua comunidade, não há razão para partir.
A vinda de Sérgio Ávila para o governo foi uma vitória para os Açores, mas uma derrota para a Terceira. Esta ilha tem perdido fôlego económico e criatividade empresarial. Limita-se a querer o que São Miguel tem. As últimas eleições autárquicas serviram de oportunidade para estabelecer um contra-poder aos socialistas. Infelizmente para Angra, – agora o posso escrever – Carlos Costa Neves foi derrotado. Sendo ele líder máximo da oposição, se ele tivesse sido eleito, o dinamismo de Angra do Heroísmo seria bem diferente. Tomo, como exemplo, a autarquia de Ponta Delgada, chefiada por Berta Cabral, alta dirigente do PSD. Quando a autarquia apresenta um novo projecto para a cidade, o governo regional encarrega-se ou de a impedir, ou de apresentar outra alternativa. Quem ganha é a população. Nos Açores, a melhor forma de fazer oposição é com um trabalho efectivo. A fraqueza do líder do PSD Açores é a de não desempenhar um cargo autárquico que mostrasse aos cidadãos as suas qualidades. Costa Neves limita-se então a conferências de imprensa e reuniões com dirigentes de vários quadrantes profissionais e simpatizantes do PSD. Muita conversa, pouca acção.
Para que cada ilha não se sinta só e não fique resignada, tem de criar um novo tipo de dinâmica que atraia investimento e, consequentemente, população. A existência de “Lóbis”, formado por empresários, jovens e intelectuais locais em parcerias com as autarquias poderá trazer novas ideias com o intuito de contornar um panorama que se avizinha negro para o Açores.
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