Complot

Este blogue nada tem de original. Fala de assuntos diversos como a política nacional ou internacional. Levanta questões sobre a sociedade moderna. No entanto, pelo seu título - Complot -, algo está submerso, mensagens codificadas que se encontram no meio de inocentes textos. Eis o desafio do século: descobri-las...

A minha foto
Nome:
Localização: Praia da Vitória, Terceira, Portugal

segunda-feira, janeiro 22, 2007

A manha da arte


Há alguns meses atrás, na cidade do Porto, fecharam-se no Teatro Rivoli dezenas de pessoas em protesto contra a privatização da gestão desse recinto, acusando o presidente da câmara, Rui Rio, de desprezar a cultura. O edil do Porto alegou que a câmara não podia financiar ou até mesmo sustentar todos os projectos ou infra-estruturas culturais, daí recorrer a privados. Num tom mais polémico, acrescentou ainda que não concordava que o dinheiro dos contribuintes fosse "alimentar" certas organizações culturais que promoviam espectáculos cuja audiência não chegava a uma centena de pessoas. Este ponto de vista, pertinente, é discutível. Terá o Estado, por mão das autarquias ou outras instituições públicas, obrigação de apoiar todos os eventos culturais desde os mais bizarros aos mais populares? Nos dias de hoje, qual o tipo de produção cultural merece ser subsidiada pelo Estado? Quem pode ser considerado um artista? Sendo Rui Rio presidente da câmara do Porto, tem todo o direito em aplicar a sua teoria. No seu ver, a cultura popular e os espectáculos que movem multidões adequam-se à sua política cultural para a cidade nortenha.

Dito isto, o que tem esta introdução a ver com o Art&manhas?

Durante o fim-de-semana, decorreu mais um Art&manhas, na Recreio dos Artistas. Organizado pelo Teatrinho, este evento cultural, que pretende fazer uma mostra de artes, recorrendo sobretudo a "artistas" locais, teve, no cômputo geral, uma adesão fraca tendo em conta a população de Angra, no entanto, do ponto de vista da organização, esta considerou-a satisfatória e fez um balanço positivo. Os factores divulgação, publicidade, ou cabeças-de-cartaz podem ter inviabilizado uma maior participação das pessoas e, consequentemente, o sucesso desta iniciativa. Caberá agora à organização tirar as suas ilações, pois se a divulgação da cultura é um dos objectivos principais do Art&manhas então os organizadores devem concordar que não foi alcançado. Para a sua concretização, o Art&manhas teve apoios financeiros de origem pública. Sendo a entrada livre e gratuita, não houve qualquer intenção em obter lucros monetários. Perante o voluntarismo de alguns e a boa vontade dos participantes, o dinheiro foi todo gasto na elaboração e produção dos diversos espectáculos que ali decorreram. Dito isto, valerá a pena continuar a patrocinar com dinheiro dos contribuintes açorianos eventos como este?

Do meu ponto de vista, sim. Mas com algumas objecções. Nos Açores, a iniciativa privada é fraca, fruto de uma cultura de risco pouco implementada e uma dependência do governo demasiado castradora. No domínio das artes, ainda é pior. A gestão cultural dos maiores recintos de espectáculos das cidades e vilas do arquipélago pertence às autarquias e ao governo. E isto é grave porque supõe que é o Estado que define o que é bom para a população em termos de cultura. O Estado deve facultar as infra-estruturas à população, recuperar e conservar o património histórico local e nacional, apostar na formação, mas não deve decidir o que a população merece ouvir e ver.

Não basta atribuir subsídios com base numas contas manhosas sobre o quanto se deve dar e com a respectiva assinatura do superior, a partir do gabinete. Algum representante dos dinheiros da cultura se deslocou ao Art&manhas para dar um incentivo moral aos jovens que se desdobram penosamente entre trabalho e família por acreditarem no que fazem? Que eu tenha conhecimento, não. Será que a Terceira, que se diz capital regional da cultura, tem assim tantos eventos que impeça um elemento da Direcção Regional da Cultura de comparecer à Recreio das Artistas, por falta de tempo? Podem alegar que não foram convidados, mas a porta esteve aberta a todos.

Mas estas dúvidas podem ser alargadas a todas as ilhas. A par do patrocínio, é preciso incentivar, "dar a mão" a organismos culturais independentes. Já que o Governo, pela mão do seu presidente, se "apoderou" da cultura nos Açores, deveria então criar a figura de produtor cultural. A sua função seria a de verificar in loco se o dinheiro é bem aplicado, com a possibilidade de apresentar sugestões às organizações empreendedoras. Outra função atribuída seria a de ser aquilo que na gíria do futebol se chama por "olheiro". Ao descobrir alguém com talento em qualquer área artística, teria de encetar contactos e lhe fazer propostas para divulgar o seu trabalho; por outras palavras, fazer de mecenas público.

A cultura é um assunto muito sério que não está devidamente discutido entre a população e os agentes políticos. O Estado perde demasiado tempo em discutir quanto deve dar, em vez de discutir a quem o deve dar e com que contrapartidas. E esta é também uma questão de gestão de recursos, não humanos, mas de talentos.

1 Comentários:

Blogger Paulo Ribeiro disse...

Paulo,

Gostei de saber da existência deste blog, sempre ficamos a conhecer mais uma olhar crítico sobre a realidade que nos rodeia, o que é muito saudável, principalmente se atendermos ao actual estado da democracia onde uma simples opinião é combatida com ataques pessoais e elevado grau de intolerância.
Não quero esgrimir aqui argumentos sobre qual deve, ou não, ser o papel do Estado relativamente à cultura (não haveria espaço). Porém, uma coisa é certa, não deve promover nem dependências, nem subserviências, nem proteccionismos. Aliás, relativamente às questões culturais, já tive oportunidade de publicamente apresentar as minhas opiniões (no meu blog “Ilhéu do Norte” de 11 Janeiro 2006).
Em relação ao Teatrinho, os seus responsáveis conhecem-me bem e sabem o que penso sobre subsídios…

Um abraço!

4:06 da tarde  

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial